Eu não me canso de escrever aqui no blog: a experiência de harmonização com cervejas é sempre pessoal. Mas além da questão do gosto e da evolução do paladar de cada um, outros fatores também afetam esse momento. É sobre isso que vou falar hoje.
O nosso estado emocional interfere muito no sabor. Se você vai experimentar uma cerveja e está com a cabeça cheia, essa “impaciência” pode ser passada também para o momento da bebida, atrapalhando a experiência. A pressa na hora de beber faz com que a bebida fique por pouco tempo na boca, diminuindo a possibilidade de perceber os sabores da cerveja. Sem falar no cheiro! Na hora do stress, a gente bebe a cerveja sem nem perceber direito o que está tomando. E o cheiro é outro fator importante na hora da degustação.
Para explicar isso melhor vou propor uma experiência: pegue um pouco de canela e coloque em um copo de leite. Tampe o nariz (bem forte mesmo) e beba o leite. Você não vai sentir nenhum gosto de canela. Depois dê aquela fungada no copo e beba o leite novamente. Sentiu o gosto da canela? Para quem não sabe, a canela não tem gosto. Mas o cheiro é tão intenso que acabamos sentindo na boca. Por isso sentir o cheiro da cerveja ajuda tanto na percepção do sabor.
Minha sugestão para quem está de cabeça cheia é beber uma cerveja que já conhece, para relaxar mesmo. Depois parta para as experiências novas.
Outra dica está na persistência. Nunca desista de uma cerveja no “primeiro gole”. Deixe passar uns dias e depois experimente novamente. É que, principalmente em uma harmonização, o que você come e bebe antes interfere no sabor do próximo “combo” de prato com cerveja. Isso pode causar um efeito ruim, principalmente na bebida seguinte.
Além disso, nosso paladar evolui com o tempo. Já tive várias cervejas que eu mal aguentei beber um copo todo, mas que agora estão entre as minhas preferidas. Um amigo passou meses tentando entender como eu conseguia beber cervejas amargas, tipo India Pale Ale ou ESB (Extra Special Bitter). Toda vez que a gente saia juntos, eu escolhia uma cerveja para ele e outra para mim. Mas o que ele não sabia é que eu estava educando o paladar dele. Comecei pelas cervejas com mais malte caramelo: Red Ale, por exemplo. São cervejas mais doces, mais avermelhadas e saborosas. E aí fui subindo o nível de amargor. Usei algumas ácidas mais frutadas (como as fruit beers) e depois passei para as Pale Ales, as Apas (que são bem cheirosas por conta dos lúpulos americanos – lembra do truque da canela?) até chegar a uma tradicional Ipa.
Tive certeza que a minha estratégia tinha dado certo quando ele provou uma Backer Pele Vermelha sem saber qual era (eu tinha pedido uma taça de chope). O resultado é que hoje ele já consegue beber cervejas que têm um amargor mais alto. Ah, meu amigo ainda não bebe cervejas mais fortes, como a Wäls Petroleum, mas um passo de cada vez, não é mesmo?